sábado, 6 de octubre de 2007

Hora de voltar



Ei, a data escrita à direita aqui no perfil está errada. Eu não estarei na Venezuela até 10 de outubro. Antecipei minha viagem em quatro dias e já estou no Brasil.

Na bagagem, um mês que não vou esquecer, uma experiência única. Mas são poucas as saudades do trânsito caótico, da desordem e da sujeira de Caracas (não é na cidade toda, importante dizer).

Sentirei falta, sim, dos amigos novos e das aventuras desses 30 dias.

Enquanto espero meu avião para Floripa (e a feijoada da minha mãe) aqui no aeroporto de Guarulhos, melhor contabilizar o que consegui fazer. Não cumpri todos os meus objetivos, mas estou certo de que fiz o possível. O mais difícil está por vir: passar pro papel essas entrevistas, visitas às emissoras e o ‘cheiro’ de Caracas, transcrevendo como é viver num país em Revolução.

Lições de Caracas:

- Nunca mais reclamar dos engarramentos entre a UFSC e minha casa.
- Nunca mais dizer que minha cidade está suja ou tomada por vendedores ambulantes. Tem coisa muito pior!
- Reclama das buzinas na Lauro Linhares (a rua principal do meu Bairro)? São fracas perto da potência dos motoristas caraquenhos, que fazem um barulho infernal das seis da manhã às 10 da noite.
- Brasileiros se ajudam em qualquer lugar, sempre. A minha estadia não seria a mesma sem a ajuda e a amizade da Rosiane, Ana Paula, Alexandre, Mário, Diana, João e Diego. Muito obrigado, mesmo!
- As mulheres brasileiras não são as mais bonitas do mundo. As siliconadas venezuelanas são um exagero de beleza.
- Ser jornalista é mais difícil do que eu imaginava. Em Caracas, então, é ainda mais complicado.
- O Brasil ainda tem muito o que aprender em comunicação. Televisão de qualidade como a que o governo venezuelano faz não existe por aqui. Grandes veículos de imprensa que peitam e criticam com intensidade o presidente do paístambém são escassos no nosso país. Lições de vida e de Jornalismo.

Entre expulsões de hotéis (os mais baratos só aceitam turistas por três dias), uma tentativa de assalto, um cartão de crédito desaparecido, apertões no metrô, visitas a três favelas, quatro rumbas de salsa e reggaetton (baladas!) e almoços barganhados no Ministério de Comunicação e Informação, sempre correndo de uma ponta a outra da cidade, sobrevivi a essa gigante.

Hora de fazer o check-in da Gol e voltar para a minha realidade, que não será mais a mesma.

A Venezuela, até então um vizinho desconhecido ali no mapa, está em ebulição. Vive uma batalha diária diante das telas de tv. Uma aula ao vivo de democracia, de poder popular, de desentendimentos e de autoritarismo. Todos juntos, regados a muita salsa e arepas.

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jueves, 4 de octubre de 2007

"Aguá, café, suco, um docinho?"



O recado veio por email: "Rosalvo, te convidamos para uma reunião com a nossa Diretora de Investigação Social, Grilba Delgado. Ela quer conversar com você".

Voltei, lógico, animado. Depois de meia hora de atraso (porque o metrô é tão lotado aqui?!), ela já esperava numa sala de reuniões da RCTV e, para minha surpresa, acompanhada com a chefa de relações institucionais do canal e mais duas jornalistas. "Nós queremos ouvir suas perguntas para a Grilba. Falaremos de um assunto que nós mesmas sabemos pouco. E ela entende muito.", explicou Gladys Zapiain, a responsável institucional e que fez meus contatos.

Grilba estava armada, preparada com apresentações no notebook. Firme, apresentou números, estatísticas de audiência, características do público-alvo da RCTV e as expectativas sobre as transmissões via cabo, que ocorrem desde 16 de julho. E, claro, não se esqueceu de criticar o presidente.

Para Grilba e outros investigadores de oposição que entrevistei, Chávez usa três estratégias principais para consolidar sua hegemonia comunicacional.

1 - Três esmissoras estatais criadas após o golpe de 2002 e o incentivo às rádios e tv's comunitárias. Para divulgar propaganda do governo. Vive, TeleSur, Tves e a veterana VTV somam-se a 11 veículos comunitários (em Caraacas) para formar o 'exército ' do Ministério de Comunicação e Informação.

2 - Cadeias presidenciais de rádios e televisão. Autorizadas pela Suprema Corte de Justiça - já existiam antes de Chávez, vale dizer -, interrompem qualquer programação para o 'comandante' transmitir seu recado. Até setembro de 2007, 1587 transmissões dominaram o rádio e a televisão venezuelana por 972 horas, o equivalente a 40 dias consecutivos.

3 - O dominical 'Aló, presidente' (vídeo). Em sua edição número 297, o programa chega a atingir 7 horas ininterruptas. A edição de 23 de setembro, sobre a Revolucion de la Salud, foi recorde desde 1999. Durou mais de oito horas.

"Nós não temos mais espaço, estamos cercados", reclama Grilba. Ela também me apresenta mapas dos Valles del Tuy, região com 700 mil habitantes que, desde junho, só recebe dois canais de televisão, a mesma voz do governo, a VTV e a Tves. Essa última substituiu a RCTV no canal 2, VHF.


Fim de reunião. Foi a primeira entrevista em que recebi água, café e guloseimas venezuelanas à vontade. Sala de reuniões chique, com cadeiras confortáveis e ar condicionado. Porque será? Alguém arrisca um palpite?

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martes, 2 de octubre de 2007

Fechou ou não renovou a concessão?



A RCTV fala de 'cierre', diz que foi fechada injustamente por uma decisão política do governo, que decidiu não renovar-lhe a concessão por mais duas décadas em virtude de seu posicionamento crítico, sua postura de oposição. Do outro lado da polêmica, o Ministério do Poder Popular para a Comunicação e Informação justifica que a atitude foi legítima, sem autoritarismo e sem feições antidemocráticas.

Para provar que a emissora foi vítima de uma arbitrariedade, Moirah Sánchez, advogada responsável pela Consultoria Jurídica da Rádio Caracas, recorre ao Reglamento sobre Concesiones para Televisoras y Radiofusoras, de 27 de maio de 1987. "Toda a concessionária cuja licença vencer após 20 anos (27 de maio de 2007) terá preferência na sua renovação, desde que tenha cumprido seu papel social e não enfrente nenhuma sanção na Justiça. É o que diz o terceiro artigo desse conjunto de leis", explica Moirah.

E ela garante que a emissora não enfrentou nenhum processo nos últimos 20 anos. "Nós fomos fechados, sim, em outras três ocasiões, mas em período anterior ao regulamento". A refência é às sanções aplicadas em 1976, 1980, 1981, quando as punições não passaram de dois dias fora do ar.

Com artilharia pesada, o governo desmente a advogada. Yuri Pimentel, ex-ministro de Comunicação e Informação e atual vice-presidente da rede TeleSur, sinaliza que o Regulamento de 1987 está ultrapassado e já foi substituído pela Lei Orgânica de Telecomunicações (LOTEL), aprovada há sete anos. A lei, ele explica, dá ao Estado o poder de decidir ou não para quem dará preferência na renovação de uma concessão (artigo 31). Além disso, "o artigo 210 da LOTEL é claro ao dizer que as permissões concedidas antes de 2000 serão reguladas pela lei de 1987", justifica Pimentel, defendendo a legalidade da decisão tomada contra a RCTV.

O ex-ministro apresentou provas contra a emissora - presentes em um dossiê preparado pelo governo, o Libro Blanco de RCTV -, que é acusada de formação de cartel, sonegação de impostos e incentivo à pornografia, entre outras acusações.

Mas para Moirah, todas as acusações não passaram de advertências do CONATEL (Comitê Nacional de Telecomunicações) e que a punição é mesmo resultado da postura ditadorial do governo, "que tem massacrado os meios privados de comunicação da Venezuela e que não se rendem ao seu poder".

"Quem disse que eles querem liberdade de expressão? Querem mesmo é direito à liberdade de mercado, de explorar a mentira e ganhar dinheiro", rebate Pimentel.

Não adianta buscar uma resposta. Cada lado tem a sua. E o duelo aqui é longo, uma guerra de todos os dias.

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lunes, 1 de octubre de 2007

Unidas até que Chávez as separe





Brasil, intervalo da novela das oito. Sentado na poltrona, você assiste a um comercial que chama o presidente Lula de mentiroso, perigoso e autoritário. Canal que também dedica quase toda a programação a espaços de opinião e com notícias para desestabilizar o governo brasileiro. Difícil imaginar que isso aconteça no nosso país? Na Venezuela, não.

Para comprovar, basta sintonizar na Globovisión ou na RCTV – a primeira em sinal aberto e a segunda via cabo. Como dois ‘cães de guarda’, elas dizem fiscalizar e vigiar cada passo do presidente e dos seus seguidores. Oposição forte, ferrenha.

Não importa a notícia. Nos quatro canais oficiais do Estado – só existia um antes do golpe – e nesses dois de oposição, os fatos serão apresentados de forma bem diferente.

Um exemplo:

Na última sexta-feira, 26, a Ministra do Poder Popular Indígena Nilsia Maldonado entregou aos deputados da Assembléia Nacional um apoio formal do ministério à Reforma Constitucional proposta pelo presidente.

Vestidos de vermelho, centenas de nativos ocuparam o pátio da Assembléia, gritaram palavras de apoio e levantaram fotos do presidente impressas no livro com o projeto de Reforma.

Tudo filmado, lógico.

Jornalistas da Venezolana de Televisión (VTV), Vive, Telesur e Antv disputaram espaço no tumulto, enquanto os aplausos eram dirigidos às câmeras e a entrega do documento cuidadosamente fotografada. Mas nem sinal das outras duas hermanas de oposição.

A verdade é que nenhuma delas estava presente, nem sequer no portão. A desculpa de que foram impedidas de cobrir o evento não convence.

Nos noticiários e no site das duas, nada, nem uma linha.

“Chávez recebeu apoio dos povos indígenas na Assembléia? Quem disse? Tem certeza?”.

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domingo, 30 de septiembre de 2007

O dono de Caracas





Nem Hugo Chávez, Gustavo Cisneros, Marcel Granier ou outro magnata da comunicação venezuelana. O verdadeiro dono da cidade tem 2.800 metros de altitude e 80 quilômetros de floresta viva. É o Ávila, montanha que abraça e vigia a capital de leste a oeste com sua mata fechada e dezenas de cachoeiras.

Visível de qualquer ponto, às vezes tomado por nuvens baixas e só com o pico descoberto, uma visita ao Monte Ávila é um convite a qualquer turista. Sete quilômetros de teleférico ou cinco horas de trilha, para os mais aventureiros, separam os que pretendem conhecê-lo.

A viagem, vale dizer, está mais barata. Custava até julho 38 mil bolívares e agora não passa dos 25. E a explicação para a mudança é simples: o governo assumiu e nacionalizou o teleférico. Mais uma das ações de estatização do presidente “para devolver o poder ao pueblo”.


Galipán


Três mil pessoas habitam o monte, os Galipán. E, lá de cima, as barreiras geográficas rompidas impressionam. Carros, tv a cabo, telefonia fixa, casas modernas, uma escola e serviço de cartão crédito - para gastar em uma das tendas de produtos típicos montadas pelos nativos – estão na lista de mordomias.

Emissoras de sinal aberto? Lógico, também chegam.

Estão presentes na região, sim, quase todas.

Sintonizar um canal pró-governo é tarefa fácil. VTV, Vive, TeleSur, Antv e Tves (substituta da RCTV) marcam presença. Agora, com a não renovação da licença da Rádio Caracas Televisão, nenhuma voz contrária ao presidente chega aos moradores. A Globovisión, único canal de oposição ao governo em freqüência aberta, também não os alcança.

Globovisión? Não conheço esse canal”, pergunta Ana Pérez, dona de uma lanchonete no povoado.

Debate de opiniões opostas. É, há coisas básicas que ainda não existem (ou já existiram) nos Galipán.

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jueves, 27 de septiembre de 2007

RCTV abre suas portas






Depois de muita vigília na porta da emissora e de diversos e-mails e telefonemas, consegui, finalmente, conhecer a Rádio Caracas Televisão, a RCTV.

Mas vamos ao que interessa:

É de um estúdio bonito e com equipamentos bastante modernos que se transmite o noticiário mais conhecido da rede, o El Observador. Com três edições diárias, o jornal bate forte no governo e não economiza críticas a simpatizantes da Revolução Bolivariana protagonizada por Hugo Chávez.

Na edição vespertina de hoje, quinta-feira, o âncora Miguel Ángel Rodríguez apresentou, indignado, (ver vídeo) o novo uniforme do time de beisebol Los Leones que, pela primeira vez na história, vai vestir-se de vermelho, rojo rojito, como diria o presidente.

Para quem não sabe, o Los Leones é propriedade de Gustavo Cisneros, o maior empresário do ramo de telecomunicações na Venezuela. O magnata é acusado pelos meios privados de ter se aliado a Chávez para poupar sua emissora, a Venevisión, de sanções como que a sofreu a colega RCTV.

“São traidores da pátria, dois vendidos”, critica o apresentador Miguel Ángel ao falar sobre Chávez e Cisneros. Sobre o presidente, ele é mais enfático: “Ele trafica com a miséria, engana o povo e os trabalhadores da Venezuela. Nós, jornalistas, corremos sérios riscos nesse país”.

Miguel também comanda o La entrevista, programa matinal de opinião que, segundo os jornalistas da redação, é a “maior dor de cabeça” para o governo chavista e foi umas das causas para a não renovação da licença do canal, em maio desse ano.

Crítica e com linha editorial declaradamente contrária ao presidente. É assim a RCTV Internacional – novo nome da emissora que desde julho transmite via cabo, pois perdeu seu sinal aberto.


Mega infra-estrutura


Cinco estúdios para gravação de novelas e programas de humor, um espaço para programas especiais como o transmitido no último dia de funcionamento, camarins impecáveis e uma redação de Jornalismo de fazer inveja a muitos canais do Brasil. Ao percorrer os corredores da RCTV, é notável a grandeza e o poder de influência que tinha a emissora de maior audiência na Venezuela. Com mais de três mil funcionários, ela alcançava 98% dos lares do país.

Mas esse quadro é coisa do passado. Hoje, via cabo, só 22% do venezuelanos têm acesso à programação da Rádio Caracas. Agora, o share – percentual de televisores ligados em cada horário – não passa dos 4%, quando antes chegava, em média, aos 40%.

Sobre a não renovação da concessão, a advogada do canal, Moirah Alexandra Sánchez, apresentou a defesa da emissora. Mas isso é assunto para outro post, quando eu conversar na próxima semana com o departamento jurídico do Conatel (Comissão Nacional de Telecomunicações). Assim, o debate fica mais justo e mais interessante.

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miércoles, 26 de septiembre de 2007

¡No vea televisión....Hágala!



Julho de 2003. Portas lacradas e equipamentos confiscados. A partir do dia 10, a entrada de funcionários está proibida nas instalações da Catia Tv. O fechamento, a mando do prefeito de oposição Alfredo Peña, durou um ano e tirou do ar a primeira televisão comunitária da Venezuela, que transmitia desde 1999 no canal 41, freqüência UHF.

Ao contrário dos protestos pela não renovação da licença da RCTV, nenhum meio privado entrou em campanha e ofereceu apoio a essa emissora. O motivo, alega a diretora Íris Castillo, é claro: “Catia Tv é do povo, feita pela comunidade. Nossas armas são as câmeras e os microfones. É com eles que nos defendemos”.

Quando explica que a produção é feita pela própria paróquia, ela não exagera. Das 14 horas diárias, 70% são destinadas a programas das Equipes Comunitárias de Produção Audiovisual Independente (ECPAI), grupos de quatro a sete pessoas que recebem formação por 10 dias para se tornarem “comunicadores sociais”, como denominam os professores das oficinas. No momento, 40 turmas participam do curso.
A meta é levar material de qualidade para as 18 paróquias da área de sua área de cobertura.

Considerada a madre das emissoras comunitárias do país, a Catia Tv – nome inspirado no Índio Cátia, que vivia e lutava na região – também sofreu repressão no golpe de 11 de abril, quando policiais metropolitanos cercaram a emissora. A saída foi negociar o resgate de alguns equipamentos.

‘Jornalistas’ iam até Miraflores, filmavam as manifestações pró-Chávez e voltavam às favelas para reproduzir os vídeos nas pequenas câmeras e convocar mais gente para os protestos. Fitas foram rebobinadas centenas de vezes.

Tudo para romper o silêncio absoluto dos meios privados, que transmitiam filmes e desenhos animados. Enquando Tom & Jerry e Superman dominavam as telas de RCTV, Globovisón e Televen, o presidente do país permanecia seqüestrado.





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